domingo, 4 de fevereiro de 2018

O SANEAMENTO COMO FATOR IMPRESCINDÍVEL PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL



O SANEAMENTO COMO FATOR IMPRESCINDÍVEL PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

SANITATION AS AN IMPACTING FACTOR FOR SUSTAINABLE DEVELOPMENT


Gabriel da Silva Danieli[1]
Rubiane Galiotto [2]
Aulus Eduardo Teixeira de Souza [3]


Resumo: O saneamento vai muito além do simples tratamento dos esgotos, abrangendo, na atualidade, desde o tratamento da água até o correto manejo de resíduos sólidos. Há muito se sabe que existe relação intrínseca entre saneamento e saúde, de forma que somente com um saneamento eficiente é possível alcançar índices satisfatórios de qualidade de vida. O presente trabalho busca, através de método analítico documental, verificar aspectos relativos à relação entre o saneamento e a saúde. Verificado tal ponto, será analisada a forma como é tratado o direito ao saneamento em âmbito internacional, verificando que, hoje, é considerado um direito humano. Por fim, será realizado estudo acerca da situação brasileira quanto ao saneamento, verificando-se que, não obstante exista crescimento da população urbana e das próprias cidades, não existe a preocupação do Poder Público com os sistemas de saneamento.

Palavras-chave: Desenvolvimento sustentável, direitos humanos; saneamento.

Abstract: Sanitation goes far beyond the simple treatment of sewage, covering nowadays from the treatment of water to the correct management of solid waste. It has long been known that there is an intrinsic relationship between sanitation and health, so that only through efficient sanitation can satisfactory levels of quality of life be achieved. The present work seeks, through an analytical documentary method, to verify aspects related to the relationship between sanitation and health. Having verified this point, the way in which the right to sanitation will be treated at the international level will be analyzed, verifying that today it is considered a human right. Finally, a study will be carried out on the Brazilian situation regarding sanitation, noting that despite the growth of the urban population and of the cities themselves, there is no public concern with sanitation systems.

Keywords: Sustainable development, human rights; sanitation.
Introdução

A história deixa claro que os sistemas de saneamento sempre fizeram parte das civilizações, sendo que, quanto mais desenvolvidos tais sistemas, mais desenvolvida era a socidade.
Atualmente se concebe que a qualidade de vida tem relação intrínseca com um saneamento eficiente, de modo que, nos locais onde é realizado de forma deficiente existe menor qualidade de vida, maior mortandade, menor desenvolvimento.
Deixou-se de analisar o saneamento como mero manejo de esgotos. Tanto a Organização das Nações Unidas – ONU quanto a legislação brasileira adotam um conceito amplo de saneamento, o qual abrange tratamento de águas pluviais, esgotos, manejo de resíduos sólidos, entre outros.
Com o desenvolvimento do conhecimento acerca do assunto e o reconhecimento da justa relação entre saneamento e saúde, passou-se a enxergar verificar que não podia esse direito ser tratado como qualquer outro, razão pela qual passou a ser reconhecido como um direito humano.
Não obstante, a situação do saneamento no Brasil – embora bastante desigual se comparadas as diferentes regiões – não reflete em seu tratamento ao tema a destacada importância que ele detém, o que se infere pelas metas previstas no Plano Nacional de Saneamento Básico – ínfimas em relação aos Objetivos para um Desenvolvimento Sustentável previstas pela ONU.
Dessa forma, o presente trabalho fará um cotejo sobre o tema, sem esgotá-lo, naturalmente, e verificar, através das pesquisas documentais e legais realizadas, a situação brasileira, concluindo que existe muito no Brasil a ser melhorado, a começar pelas próprias metas de melhoria.

O saneamento como fator indispensável à manutenção da vida

As noções de saneamento podem ser notadas desde as mais antigas culturas, tendo se desenvolvido conforme a evolução das civilizações, bem como tendo regredido conforme essas entravam em derrocada.
Há notícias de um civilização que viveu onde hoje se situa a Índia denominada Harapense ou Harapeana, cujo auge se deu entre 2.500 a.C a 1.900 a.C., em que as escavações demonstraram a existência de um sistema de saneamento mais bem elaborado do que certos sistemas atualmente existentes.
Nessa civilização, existia um sistema hidráulico que possibilitava que todas as casas tivessem poços de água, além de todas as residências possuírem vasos sanitários ligados a um canal de esgoto comum, coberto por lajes de pedra e que percorria toda a cidade.[4]
Ademais, a Bíblia Sagrada apresenta diversas passagens que demonstram hábitos dos judeus que insinuam fatores de saneamento, como a lavagem das roupas que favoreciam doenças como a escabiose, razão pela qual os poços de água deveriam permanecer limpos.
Há que se citar, ainda, a Cloaca Máxima, localizada em Roma, que é considerado um dos primeiros sistemas de coleta de esgotos do mundo, a qual era formada por aquedutos, banhos públicos, termas e esgotos.[5]
Na Idade Média, o consumo de água na Europa – devido à falta de água não poluída – teve uma queda vertiginosa, chegando a atingir, em certas cidades, 1 L de habitante por dia. Para fazer um comparativo, atualmente, no Brasil, uma família residente em uma cidade com mais de 100 mil habitantes consome entre 250 e 300 litros de água por dia.[6]
Além disso, nessa época existem fortes indícios de que os dejetos eram lançados na rua, a água não era tratada, não existia preocupação com descarte de lixo em locais apropriados. Por consequência, como hoje se sabe, ocorreram grandes epidemias, tais como a Peste Negra.
Fora somente no século XIX que se passou a associar cientificamente a ausência de saneamento – ou o saneamento ineficiente – a problemas de saúde relacionados com a água, fossem por agentes físicos, químicos ou biológicos.
Atualmente, segundo HELLER[7], existem diversos modelos propostos para explicar a relação entre as ações de saneamento e a saúde, enfocando diferentes ângulos, enfocando diferentes aspectos, alguns mais biologicistas, outros mais sistêmicos, com determinantes sociais.
Quanto aos modelos que associam o saneamento a doenças encontradas na população, existem diversos autores que buscam relacionar o saneamento – ou sua ausência – ao aparecimento de doenças específicas, como diarreias, até a fatos mais amplos, como mortes de pessoas.
Nessa corrente, há que se destacar BRISCOE, para quem os efeitos do saneamento, embora sejam imensuráveis a curto prazo, têm maior relevância do que intervenções médicas a longo prazo.[8]
Ainda conforme o mencionado autor, baseado em uma simulação de dados demográficos de Lyon (França) entre 1816 e 1905, evidenciou-se que as intervenções ambientais preveniram cerca de quatro vezes mais mortes e elevaram a expectativa de vida sete vezes mais do que as intervenções de natureza biomédica.[9]
Há, também, autores que formulam uma relação estreita entre o saneamento ineficiente e doenças específicas relacionadas a enfermidades diarreicas, tendo como um de seus idealizadores CVJETANOVIC. Contudo, o próprio autor reconhece a dificuldade metodológica para comprovação de sua teoria, além de não levar em consideração aspectos sociais.[10]
Contudo, o mais correto, sem dúvida, é somar fatores de saneamento com fatores sociais e buscar associá-los à saúde da população analisada. Ora, não é possível analisar uma pessoa com altos recursos financeiros com outra que vive na pobreza, pois embora a localidade em que vivam seja próxima, não terão as mesmas condições de saneamento.
Nesse sentido, HELLER afirma que na maioria dos estudos publicados onde o objeto é a relação entre saneamento e saúde existe uma relação positiva entre o saneamento e o indicador de saúde analisado. Ressalva, contudo, que ainda não existe uma avaliação abrangente capaz de afirmar as especificidades dessa relação.
Ademais, HELLER, que é o relator especial da ONU sobre direitos humanos à água potável e ao saneamento básico, a ausência de estruturas sanitárias adequadas tem um “efeito dominó”, prejudicando a busca e o desfrute de outros direitos humanos, como o direito à saúde, à vida e à educação, além de favorecer prejudicando a busca e o desfrute de outros direitos humanos, como o direito à saúde, à vida e à educação.[11]
No Brasil, deve ser salientado que a aceitação do saneamento como fator que influencia determinantemente a qualidade da saúde da população se encontra no disposto na Lei nº 8.080/1990, conforme se transcreve:

Art. 3º  Os níveis de saúde expressam a organização social e econômica do País, tendo a saúde como determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, a atividade física, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais.[12]

Desta forma, embora não existam estudos que demonstrem pormenorizadamente as relações específicas entre a ausência de saneamento e problemas de saúde da população, é fato que existe essa relação, de forma que somente quando se passar a tratar o assunto com a eficácia demandada é que se reduzirão seus efeitos deletérios.

O reconhecimento do direito ao saneamento como direito humano

A água, conforme dispõe a ONU, está no centro do desenvolvimento sustentável, de forma que os recursos hídricos contribuem de forma determinante para a redução da pobreza, para o crescimento econômico e para a sustentabilidade ambiental.[13]
Contudo, falar em saneamento não se trata apenas de analisar a existência de água potável para a dessedentação. Vai muito além.
A definição clássica de saneamento provém da formulação feita pela ONU: saneamento constitui o controle de todos os fatores do meio físico do homem, que exercem ou podem exercer efeitos deletérios sobre seu estado de bem estar físico, mental e social.[14]
No Brasil, têm-se acrescido a essa definição aspectos ligados normalmente a recursos hídricos, especialmente abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza pública, drenagem pluvial e controle de vetores de doenças transmissíveis.
Um dos objetivos da ONU para a Desenvolvimento Sustentável é justamente o saneamento – embora apareça ao lado do item “água potável” -, conforme se infere do Objetivo 6, que dispõe sobre metas a serem alcançadas.[15]
Dentre tais metas, encontram-se, entre outros, alcançar saneamento e higiene adequados e equitativos a todos, acabar com a defecação a céu aberto, com especial atenção às mulheres e meninas em situação de vulnerabilidade, reduzir a poluição, diminuindo águas residuais não tratadas e aumentando substancialmente a reciclagem, implementação de gestão integrada de recursos hídricos, aumentar a cooperação internacional nesse tema e apoiar e fortalecer a participação das comunidades locais na busca dessas metas.
O grande problema dos Objetivos traçados pela ONU com vistas no desenvolvimento sustentável está no fato de que tais determinações têm caráter de soft law, ou seja, suas formulações não vinculam os Estados, apesar de exercerem certa pressão política sobre eles, uma vez que, se eles se conformarem com a prática, ela pode se desenvolver e resultar depois de algum tempo na consciência de que existe obrigação jurídica, que pode dar origem ao nascimento do costume.[16]
Ainda assim, ressalta-se a problemática das normas não imperativas, pois somente serão concretizáveis caso exista uma disposição dos Estados a se comprometerem com elas, o que não é tarefa simples de ser alcançada.
Apesar disso, é importante esclarecer que a própria ONU já identificou o saneamento como um direito humano, consoante se infere no Relatório para um Mundo Sustentável disponibilizado pela organização.[17]
Nesse sentido, no âmbito da ONU, dois documentos podem ser destacados quanto ao tema:  (i) os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, firmado pelo Brasil e outros 190 países, em setembro de 2000, prevendo, entre outras metas relacionadas ao saneamento básico, a redução em 50%, até 2015, da parcela da população que não tinha acesso à água potável e ao esgotamento sanitário no ano de 1990; e (ii) a Resolução A/RES/64/292, da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 28 de julho de 2010, apoiada por 122 nações, com 41 abstenções e nenhum voto contrário, com forte suporte da diplomacia brasileira, e que trata dos direitos à água e ao esgotamento sanitário, afirma ser o acesso à água limpa e segura e ao esgotamento sanitário adequado um direito humano, essencial para o pleno gozo da vida e de outros direitos humanos.
Ainda há que se destacar que recentemente, em dezembro de 2016, a Assembleia Geral da ONU reconheceu que o saneamento é direito humano distinto do direito à água potável, destacando o grande número de pessoas no mundo que não dispõem de saneamento básico.[18]
O fato de ter sido considerado um direito humano modifica consideravelmente o tratamento dado ao tema, uma vez que pode caminhar esse direito para o sentido de, em algum momento, ser considerado norma imperativa, jus cogens, com efeitos erga omnes aos Estados.
Independente de ser norma jus cogens ou mero soft law, é importante destacar que fora reconhecido como um direito humano, sendo necessário mencionar o princípio de Direito Internacional denominado effet utile, ou princípio da efetividade, pelo qual é necessário assegurar aos direitos humanos os efeitos pretendidos.
Conforme conceitua RAMOS, direitos humanos são “um conjunto mínimo de direitos necessário para assegurar uma vida do serumano baseada na liberdade, igualdade e na dignidade”.[19]
Aliás, em se tratando de direitos humanos, RAMOS preceitua:

Em geral, todo direito exprime a faculdade de exigir de terceiro, que pode ser o Estado ou mesmo um particular, determinada obrigação. Por isso, os direitos humanos têm estrutura variada, podendo ser: direito-pretensão, direito-liberdade, direito-poder e, finalmente, direito-imunidade [...][20].

Assim, o saneamento se enquadra claramente na definição de direito-pretensão, uma vez que consiste na busca de um direito que gera a contrapartida para o Estado de prestar esse serviço.
Tendo sido reconhecido o saneamento como direito humano, fora inserido na Declaração de Johannesburgo, de 2002, também denominada Rio+10, em seu Princípio 18, como um dos focos da Cúpula, tendo como meta a rápida ampliação de seu acesso. Infelizmente, nem a Rio+10, nem a Rio+20 (Conferência ocorrida no Rio de Janeiro em 2012 com o mesmo foco) apresentaram resultados significativos.
O fato de ter caráter de direito humano dispensa a necessidade de adesão dos Estados a um tratado específico que disponha sobre o assunto, sendo possível a imposição, pela própria ONU, através de seus instrumentos, aos Estados que desenvolvam seus sistemas de saneamento. Até o momento, no entanto, a ONU tem se limitado a editar normas programáticas, sem vinculação aos Estados, ou seja, regras soft law.
Contudo, a própria Declaração, embora não tenha caráter de Tratado Internacional, não se sujeitando à Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados – salvo para os fins de interpretação -, pode ensejar ações concretas da organização.
Da mesma forma, caso não sejam implementados planos de saneamento condizentes aos Objetivos previstos pela ONU, é possível a responsabilização internacional do Estado negligente, uma vez que direitos humanos estarão a ser desrespeitados.
Novamente se valendo da doutrina de RAMOS, pode-se dizer que os direitos humanos são valores essenciais, os quais podem ser explícita ou implicitamente retratados nas Constituições, tendo todos em comum quatro ideias: universalidade, essencialidade, superioridade normativa (preferencialidade) e reciprocidade.[21]
Cabe aos Estados agirem em prol da realização da norma programática disposta pela ONU, no sentido de ver realizado um direito humano de suma importância à população local e, sem qualquer exagero, à população mundial.
Dessa forma, existe, atualmente, consenso internacional de que o saneamento é um direito humano e, como tal, deve ser implementado pelos Estados, preferencialmente sem deixarem esses de observar os Objetivos previstos pela ONU para o Desenvolvimento Sustentável, sob pena de responsabilização estatal por ofensa aos direitos humanos de suas respectivas populações.

A desídia do Poder Público com relação ao saneamento básico

O direito ambiental detém reconhecida importância na sociedade atual, de modo que há quem afirma até mesmo que hoje se vive em um Estado de direito ambiental e ecológico[22], sendo necessário, assim, que as normas já existentes sejam utilizadas de forma correta para que, de fato, se efetive a proteção ao meio ambiente.
Uma das facetas inafastáveis do desenvolvimento sustentável humano – adotando-se para este trabalho o conceito de desenvolvimento sustentável trazido por STEINMETZ, CARVALHO e FERRE (2015), para quem o Princípio do Desenvolvimento Sustentável é composto essencialmente de três dimensões, quais sejam, econômica (permitir o crescimento econômico), social (garantir a qualidade de vida), e ambiental (preservar a natureza)[23] – diz respeito à proteção ambiental, notadamente em face da conjuntura ecológica do planeta Terra, em que o homem precisa da natureza para a manutenção da vida.
Conforme Relatório da ONU,

Percursos de desenvolvimento insustentável e falhas de governança têm afetado a qualidade e disponibilidade dos recursos hídricos, comprometendo a geração de benefícios sociais e econômicos. A demanda de água doce continua aumentando. A não ser que o equilíbrio entre demanda e oferta seja restaurado, o mundo deverá enfrentar um déficit global de água cada vez mais grave.[24]

Uma das formas de frear a poluição que impede o próprio desenvolvimento humano deve se dar com o aumento do saneamento, sendo esse, inclusive, um dos objetivos da ONU para a Desenvolvimento Sustentável acima mencionado.
No contexto brasileiro, em 2007 foi editada a Lei n° 11.445, a qual estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico, altera as Leis de números 6.766/1979, 8.036/1990, 8.666/1993, 8.987/1995, e revoga a Lei n° 6.528/1978, entre outras providências.
Para os fins da referida norma, considera-se saneamento básico o conjunto de serviços, infraestruturas e instalações operacionais de abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo de recursos sólidos, e drenagem e manejo das águas pluviais, limpeza e fiscalização preventiva das respectivas redes urbanas.
É perceptível que o legislador brasileiro tomou por saneamento uma concepção ampla e completa, abrangendo muito mais do que o correto manejo da água e dejetos humanos que necessitam de esgotamento.
Aliás, é importante mencionar que a lei excluiu expressamente os recursos hídricos dos serviços públicos de saneamento, ou seja, a gestão de ambos deve se dar de forma autônoma.
Para dar eficácia ao diploma legal, fora instituído por disposição da própria lei, o Plano Nacional de Saneamento Básico – PNSB (que somente fora instituído em 2013), bem como, no intuito de promover a incrementação de saneamento, fora instituído o Biênio Brasileiro de Saneamento – 2009-2010, através do Decreto nº 6.942/2009.
O PNSB apresenta um planejamento abrangente do saneamento no país, apresentando competências, metas de curto, médio e longo prazo, macrodiretrizes e estratégias, formas de monitoramento, avaliação e revisão, entre outros pontos.
Com relação à competência para a confecção dos planos de saneamento, é cabível aos Municípios com população superior a 50 mil habitantes apresentarem seus planos de saneamento, recebendo, então, aportes financeiros, apoio técnico, entre outros necessários para o desenvolvimento de seus respectivos sistemas.
Conforme dispõe o PNSB, em 2010, 85% da população brasileira tinha acesso a água potável, mas apenas 53% tinha acesso a rede geral de esgoto ou pluvial – sem se considerar as variações entre as diversas regiões do país. Porém, apenas 10,9% dos Municípios do Brasil contavam com plano municipal de saneamento.[25]
Levando-se em consideração que o PNSB data de 2012, era de se esperar uma melhora considerável nesses números, de forma que fossem implementados novos sistemas de saneamento no Brasil.
Entretanto, conforme Relatório apresentado pelo Ministério das Cidades[26], em janeiro de 2017 cerca de 30% das cidades brasileiras com mais de 50 mil habitantes haviam apresentado um plano de saneamento – conforme declaração das próprias cidades. Ainda, mais 38% declararam estar elaborando o plano.
A meta de Municípios com plano de saneamento prevista no PNSB era, para o ano de 2018, de 32%, sendo de 51% para 2023 e de 70% em 2033. O resultado, portanto, está próximo da meta.
Deve-se, ainda, levar em consideração que esse percentual tende a aumentar, uma vez que, conforme dispõe o Decreto nº 8.629/2015, após 31 de dezembro de 2017[27], a existência de plano de saneamento básico, elaborado pelo titular dos serviços, será condição para o acesso a recursos orçamentários da União ou a recursos de financiamentos geridos ou administrados por órgão ou entidade da Administração Pública federal, quando destinados a serviços de saneamento básico.
Note-se que será do interesse do Município a existência do plano de saneamento, sob pena de ter que arcar com todas as despesas – sem auxílio do Governo Federal – em cada obra relativa a saneamento básico necessária.
Porém, embora exista uma proximidade dos resultados alcançados no Brasil com as metas traçadas no PNSB, deve-se ter em conta que o próprio PNSB apresenta metas que estão muito aquém das previstas pela ONU em seus Objetivos, uma vez que, em se tratando de saneamento, a organização busca o seguinte resultado:

Até 2030, alcançar o acesso a saneamento e higiene adequados e equitativos para todos, e acabar com a defecação a céu aberto, com especial atenção para as necessidades das mulheres e meninas e daqueles que estão em situação de vulnerabilidade[28]

Lamentavelmente, a exemplo de muitas outras questões ambientais, falta interesse político em nosso país para dar andamento a uma maior acessibilidade da população a sistemas de saneamento que possibilitem uma boa qualidade de vida, pois se tem a visão que o crescimento econômico é suficiente para que se alcance o desenvolvimento, o que fica, no mundo contemporâneo, cada vez mais evidente que não é possível.
E se a meta da ONU – saneamento para todas as pessoas – é audaciosa e, talvez, utópica, que sirva ao menos de inspiração aos Poderes Executivo e Legislativo, pois se o esforço for para alcançar a excelência, mesmo que não seja atingida, trará melhores resultados do que se a meta for meramente razoável, como ocorre atualmente.


Considerações finais

Resta evidente que o saneamento está intimamente ligado à qualidade de vida de uma população, de maneira que as nações que o negligenciam têm suas populações arcando com os problemas causados pela desídia.
Conforme notícia publicada pela Organização Mundial de Saúde em 2014, para cada dólar investido em água e saneamento, são economizados 4,3 dólares em saúde global, levando-se em consideração fatores direta e indiretamente ligados a esses recursos.[29]
Não obstante, os poderes públicos dos países têm relutância em aceitar que um desenvolvimento só se dará de forma sustentável se for garantido o direito ao saneamento à população – hoje reconhecido como um direito humano.
O Brasil lamentavelmente caminha a passos lentos em direção à efetivação de um saneamento eficiente para sua população – mesmo consideradas as discrepâncias entre as diversas regiões, o que pode ser explicado pela própria inexpressividade das metas de saneamento previstas no Plano Nacional de Saneamento Básico, que busca alcançar resultados que ficam muito abaixo daqueles indicados pela ONU.
Por tais razões, deve ser revisada a meta de saneamento do Plano Nacional de Saneamento Básico, não para dar alívio aos Municípios que agiram de forma omissa e ainda não apresentaram planos de saneamento, mas sim, para dar preferência aos interesses da população, que terá evidentes ganhos caso tenha acesso a esse direito humano.

Referências

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[1] Mestrando em Direito Ambiental na Universidade de Caxias do Sul – UCS. Taxista CAPES. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/7083546133472274. E-mail: gsdanieli@ucs.br
[2] Mestranda em Direito Ambiental pela Universidade de Caxias do Sul/RS. Especialista em Direito Público pelo programa de pós graduação em direito convênio Universidade de Caxias do Sul – Escola Superior da Magistratura Federal – ESMAFE/RS. Servidora Pública do Município de Caxias do Sul. Advogada. Conciliadora Cível na Comarca de Flores da Cunha/RS. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/4723808454178892. E-mail: rubianegaliotto@gmail.com
[3] Mestrando em Direito Ambiental na Universidade de Caxias do Sul – UCS. Advogado. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5138326964068427. E-mail: aulus.sc@gmail.com
[4] DOMINGUES, Joelza Ester. A misteriosa civilização de Harappa. Disponível em < http://www.ensinarhistoriajoelza.com.br/a-misteriosa-civilizacao-de-harappa/>. Acesso em 25. Ago. 2017.
[5] La cloaca máxima de Roma. Disponível em < https://www.iagua.es/blogs/jose-diego-garcia/cloaca-maxima-roma>. Acesso em 25 ago. 2017.
[6] Manual saneamento. Disponível em < http://www.ceset.unicamp.br/~mariaacm/ST514/mansan02_33_51.pdf>. Acesso em 25 ago. 2017.
[7] HELLER, Léo. Relação entre saúde e saneamento na perspectiva do desenvolvimento. Disponível em <http://www.redalyc.org/html/630/63013484007/>. Acesso em 25 ago. 2017.
[8] BRISCOE, James. Evaluating water supply and other health programs: short-run vs long-run mortality effects. Public Health 99. 1985. P. 142-145. Apud HELLER, Léo. Relação entre saúde e saneamento na perspectiva do desenvolvimento. Disponível em <http://www.redalyc.org/html/630/63013484007/>. Acesso em 25 ago. 2017.
[9] BRISCOE, James. Abastecimiento de agua y servicios de saneamento: su función em la revolución de la supervivência infantil. Boletin de la Oficina Sanitaria Panamericana 103. 1987. P. 325-339. Apud HELLER, Léo. Relação entre saúde e saneamento na perspectiva do desenvolvimento. Disponível em <http://www.redalyc.org/html/630/63013484007/>. Acesso em 25 ago. 2017.
[10] CVJETANOVIC, Branko. Health effects and impacto d water supply and sanitation. World Health Statistics Quarterly. 1986. P. 105-117. Apud HELLER, Léo. Relação entre saúde e saneamento na perspectiva do desenvolvimento. Disponível em <http://www.redalyc.org/html/630/63013484007/>. Acesso em 25 ago. 2017.
[11] Organização das Nações Unidas. Assembleia Geral da ONU reconhece saneamento como direito humano distinto do direito à água potável. Disponível em <https://nacoesunidas.org/assembleia-geral-da-onu-reconhece-saneamento-como-direito-humano-distinto-do-direito-a-agua-potavel/>. Acesso em 25 ago. 2017.
[12] BRASIL, Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990.  BRASIL. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, DF: 19 set. 1990. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm>.  Acesso em: 25 ago. 2017.
[13] Organização das Nações Unidas. Água para um mundo sustentável. Disponível em <http://www.unesco.org/new/fileadmin/MULTIMEDIA/HQ/SC/images/WWDR2015ExecutiveSummary_POR_web.pdf>. Acesso em 21 ago. 2017.
[14] HELLER, Léo. Relação entre saúde e saneamento na perspectiva do desenvolvimento. Disponível em <http://www.redalyc.org/html/630/63013484007/>. Acesso em 21 ago. 2017.
[15] Organização das Nações Unidas. Objetivo 6: água potável e saneamento. Disponível em < http://www.unric.org/pt/objetivos-de-desenvolvimento-sustentavel/31975-objetivo-6-agua-potavel-e-saneamento>. Acesso em 25 ago. 2017.
[16] ACCIOLI, Hildebrando. SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; CASELLA, Paulo Borba. Direito Internacional Público I. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
[17]Organização das Nações Unidas. Água para um mundo sustentável. Disponível em <http://www.unesco.org/new/fileadmin/MULTIMEDIA/HQ/SC/images/WWDR2015ExecutiveSummary_POR_web.pdf>. Acesso em 25 ago. 2017.
[18] Organização das Nações Unidas. Assembleia Geral da ONU reconhece saneamento como direito humano distinto do direito à água potável. Disponível em <https://nacoesunidas.org/assembleia-geral-da-onu-reconhece-saneamento-como-direito-humano-distinto-do-direito-a-agua-potavel/>. Acesso em 25 ago. 2017.
[19] RAMOS, André de Carvalho. Teoria geral dos direitos humanos na ordem internacional. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. P. 40.
[20] RAMOS, André de Carvalho. Curso de direitos humanos. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. P. 29.
[21] RAMOS, André de Carvalho. Curso de direitos humanos. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
[22] CANOTILHO, José Joaquim Gomes (Org.); LEITE, José Rubens Morato (Org.). Direito constitucional ambiental brasileiro. 2 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2008. P. 5.
[23] STEINMETZ, Wilson; CARVALHO, Márcio Mamede Bastos de; FERRE, Fabiano Lira. O conceito jurídico do princípio do desenvolvimento sustentável no ordenamento jurídico brasileiro: por um conceito adequado e operativo. Revista Direito Ambiental e Sociedade. Disponível em <http://www.ucs.br/site/midia/arquivos/E-book-Direito-ambiental-sociedade.pdf>. Acesso em 30 maio 2017. P. 77-96.
[24] Organização das Nações Unidas. Água para um mundo sustentável. Disponível em <http://www.unesco.org/new/fileadmin/MULTIMEDIA/HQ/SC/images/WWDR2015ExecutiveSummary_POR_web.pdf>. Acesso em 21 ago. 2017.
[25] Plano Nacional de Saneamento Básico. Disponível em < http://www.mma.gov.br/port/conama/processos/AECBF8E2/Plansab_Versao_Conselhos_Nacionais_020520131.pdf>. Acesso em 25 ago. 2017.
[26] BRASIL. Ministério das Cidades. Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental. Panorama dos planos municipais de saneamento básico no Brasil. Ed. jan. 2017. Disponível em < http://www.cidades.gov.br/images/stories/ArquivosSNSA/Arquivos_PDF/panorama_planos_municipais_de_saneamento_basico.pdf>. Acesso em 25 ago. 2017.
[27] BRASIL, Decreto 8.629, de 30 de dezembro de 2015.  Altera o Decreto nº 7.217, de 21 de junho de 2010, que regulamenta a Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, que estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico. Diário Oficial da União. Brasília, DF: 31 dez. 2015. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Decreto/D8629.htm>.  Acesso em: 25 ago. 2017.
[28] Organização das Nações Unidas. Objetivo 6: água potável e saneamento. Disponível em < http://www.unric.org/pt/objetivos-de-desenvolvimento-sustentavel/31975-objetivo-6-agua-potavel-e-saneamento>. Acesso em 25 ago. 2017.
[29] Organização Mundial de Saúde – ONU. OMS: Para cada dólar investido em água e saneamento, economiza-se 4,3 dólares em saúde global. Disponível em < https://nacoesunidas.org/oms-para-cada-dolar-investido-em-agua-e-saneamento-economiza-se-43-dolares-em-saude-global/>. Acesso em 25 ago. 2017.

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