A TEORIA DO RISCO E O MEIO AMBIENTE: A
DINÂMICA ENTRE A TEORIA DO RISCO E AS AÇÕES DE PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE
THE THEORY OF RISK AND THE ENVIRONMENT: THE DYNAMICS
BETWEEN THE THEORY OF RISK AND THE ACTIONS OF PROTECTION OF THE ENVIRONMENT
Aulus Eduardo Teixeira de Souza [1]
Gabriel da Silva Danieli[2]
Rubiane Galiotto [3]
Resumo: A compreensão das conformações sociais
sobre o conceito de Risco, sociedade do risco, desenvolvimento sustentável e
direitos naturais humanos e, de como estes aspectos têm se relacionado nas
últimas décadas, é determinante para analisar a dinâmica com que as medidas de
proteção ambiental evoluem e se relacionam nas sociedades modernas. É por meio
da pesquisa bibliográfica e documental, que se tenta demonstrar a influência
dos fatores que influenciam os acontecimentos mundiais, adstritos à proteção do
meio ambiente e a construção dos conceitos de sociedade de risco e
desenvolvimento sustentável. Valendo-se do método hermenêutico, o autor fomenta
o aprofundamento científico de que a teoria do risco está intimamente
relacionada com as medidas de proteção ambiental no mundo contemporâneo.
Palavras-chave: Teoria do risco; desenvolvimento
sustentável; meio ambiente.
ABSTRACT: The understanding of social
conformations about the concept of Risk, society of risk, sustainable
development and human natural rights, and how these aspects have been related
in the last decades, is decisive to analyze the dynamics with which
environmental protection measures evolve and in modern societies. It is through
bibliographical and documentary research that one tries to demonstrate the
influence of the factors that influence the world events, assigned to the
protection of the environment and the construction of the concepts of society
of risk and sustainable development. Using the hermeneutic method, the author
encourages the scientific deepening that the theory of risk is closely related
to the measures of environmental protection in the contemporary world.
Keywords: Risk theory;
sustainable development; environment.
INTRODUÇÃO
A compreensão profunda dos
riscos que orbitam o meio ambiente requer das medidas protetivas de seu manejo
inclinações sobre o que de fato são riscos e como eles influenciam a sociedade.
É preciso mensurá-los de forma racional para que esse conjunto de instrumentos,
destinados a mitigar seus efeitos, tenham eficácia na proteção do ambiente
natural e artificial.
Os paradigmas empíricos
imersos no conceito de risco afastam, muitas vezes, as concepções predominantes
do intérprete, pois a concepção individualista de cada um se amolda à
pré-compreensão do que realmente seja risco. Contudo, nem por isso se afasta a
necessidade de compreensão a ser estabelecida pelo uso efetivo dos instrumentos
de controle do risco, com a finalidade de possibilitar o livre exercício do
direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e à sadia qualidade de vida
das presentes e futuras gerações.
Conceituando o termo
“equilíbrio” é possível depreender que garantir o equilíbrio é controlar riscos
em detrimento de algo relevante, no caso, a sadia qualidade da vida, mesmo
porque o patrimônio ambiental já coexiste com uma “sociedade do risco”,
concebida desde a revolução industrial pela busca progressiva de bem-estar e
consumismo industrial da humanidade moderna.
Ademais, Silveira (2014,
p.17) esclarece que colocar em prática ações de tamanha complexidade requer a
ultrapassagem das fronteiras subjetivas e imóveis do que seja meio ambiente
equilibrado, necessitando, portanto, de proteção contra danos cuja manutenção
requer a limitação, pelo poder estatal, das ações letais ambientais e do
exercício privado do direito de propriedade.
Não menos importante é a
correlação existente entre o senso comum e o conhecimento científico, porquanto
a teorização da mensurabilidade do risco impacta diretamente na forma e no
comportamento da sociedade. Considerando o meio ambiente como protagonista
principal das sociedades pós-industriais, tem-se que a incompreensão acerca do
risco que o ameaça compromete a sobrevivência das gerações.
É necessário que a interação
dinamizada dos riscos diretamente ligados ao meio ambiente sofra a adequada
pressão do direito, ferramenta essencial de garantia, para que o meio ambiente
e os atores sociais se agrupem no contexto de afirmação do sentido coletivo
exigido para a qualidade de vida futura.
Bobbio (1995, p.51) afirma
que o direito, fundado no princípio do individualismo e variabilidade do homem,
é a afirmação da inexistência de unicidade jurídica, seja no tempo, seja no
espaço. Não se trata de produções normativas ideológicas, mas de natividade
histórica, porquanto vem à luz nos sedimentos do desenvolvimento histórico da
interrelação holística da humanidade e seus fenômenos sociais variáveis,
sobretudo, no cenário social em que se apresenta.
Certo é que, diante da
existência referenciada de mensurabilidade, o risco a que se submete o direito
contemporâneo das pessoas e dos grupos sociais está incrustado artificialmente
sob a camada de intolerância social criada pelo estado moderno no meio ambiente
urbano. Advém, com efeito, do sentimento justo e injusto do contexto
jurídico-normativo, primitivo, popular e empírico de uma nação.
Mas, será válida essa busca
frenética promovida pela modernidade do conforto a qualquer preço, um suposto
desenvolvimento social à custa de sacrífico do ambiente onde se vive? Será
imperceptível a intangência dos impactos que tais ações podem provocar? Parece
evidente não se vislumbrar que tal atitude provocará a extinção dos meios e
recursos naturais de que disponibilizamos para sobreviver. Já escassos, estes
recursos naturais encontrados nos biomas ecológicos alcançam, sobretudo, o
ambiente urbano.
Fundada nas indagações
sumariamente propostas, a exposição busca analisar como a teoria do risco
impacta no meio ambiente e de que maneira a mensuração do núcleo elementar
desta teoria colabora para os efeitos nocivos que agridem a vida, prejudicando
o equilíbrio ecológico e social das gerações afetadas, seja presente ou futura.
A indagação nuclear é como se dá o desenvolvimento da dinâmica e o
processamento fenomênico do risco na relação com o ambiente.
Através da pesquisa
bibliográfica e documental serão analisados os pontos de maior relevância
acerca dos conceitos alavancados pela teoria do risco e seu impacto e relacionamento
com ambiente urbano formado nas sociedades contemporâneas. Valendo-se do método
indutivo e hipotético-dedutivo, no cerne da pesquisa preliminar à estrutura do
material em apreço, procura-se compreender os fenômenos e circunstâncias que
enredam o contexto do risco empírico explícito no meio ambiente urbano pelo
método dialético, cuja retórica dos argumentos articulados sagrou-se necessária
para demonstrar a verossimilhança das proposições.
Para melhor balizar a
compreensão do trabalho, cumpre creditar que a primeira parte se apresenta como
breve introito acerca da hermenêutica jurídica de Dworkin (2014), manejando
alguns aspectos críticos da razão pura de Kant (2015), apresentando argumentos
superficiais sob o enfoque do observatório da estrutura estatal do poder
econômico de Morais (2015).
Em curso, serão invocados os
argumentos de Silveira (2014) acerca da sociologia do risco e a tutela dos
direitos coletivos em favor do meio ambiente urbano, uma análise fundada no
direito comparado sobre como outras nações conduzem a problemática no trato
ambiental, verificando como o envolvimento direto e amplo do cidadão poderá
tornar mais efetiva a aplicação da normativa e dos princípios no âmbito
jurídico de proteção ambiental – Convenção de Åarhus[4].
E ainda, como a precaução exerce sua influência no decisionismo jurisdicional
da incerteza provocada sobre a temática.
Por fim, serão avaliadas a
relevância da análise de riscos, sua arquitetura e fragilidade social
destacando aspectos antropológicos que revelam a perceptividade de suas
dimensões e como se dá a impactividade do instituto no protecionismo ambiental,
conjecturando as argumentações acerca do postulado de desenvolvimento
sustentável e direitos humanos de Moreira (2015).
Não se olvida a relevante
necessidade de formação de um paradigma sustentável para justificar a aplicação
da teoria do risco e suas vertentes científicas no contexto
macro-sócio-econômico das sociedades contemporâneas, mesmo porque o adequado
delineamento desta estrutura viabilizará seu manejo em favor do meio ambiente,
contudo, os parâmetros a serem utilizados carecem, sobretudo, de consolidação
técnica, para que sejam aceitos pelas comunidades científicas.
Para que se reconheça a
transitoriedade temporal do assunto como paradigma científico é mister a
aceitação da articulação de sua fase pré-paradigmática, mais ou menos
específica de conceituação natural, em que pesquisadores reconhecem a
probabilidade da vertente necessária que baliza o conceito, tal qual se
verifica nas teorias de domínios conexos, regras metodológicas, padrões e
valores do futuro paradigma.
Kant (2015, p.344) assevera
que não se pode provocar precocemente a ruptura do dogma pré-concebido em face
da episteme[5]
física admitida, posto que, sendo a matéria e seus fenômenos, meras alegorias
representativas aptas à construção do paradigma, logo, o desconhecimento dos
aspectos considerados na fase pré-paradigmática não se prestará a arquitetura
de um objeto desconhecido se o modelo pré-concebido, anteriormente, não
transferir de si as coisas verdadeiras.
É nessa ótica que se deu o
nascimento do estado contemporâneo, na ruptura dos paradigmas que viabilizaram
os pressupostos políticos-normativos para a ressignificação da vontade popular
fundada no princípio da soberania popular insculpido na Constituição Federal em
vigor. A edificação constitucional da proteção dos direitos individuais e
coletivos provocaram o nascimento de novos direitos a serem tutelados no
contexto ambiental, que ganharam força com o liberalismo econômico e suas
variáveis socioculturais.
Deste panorama exsurge a
instituição de um arcabouço de premissas e demandas impostas à nação para que a
vida possa se desenvolver de maneira igualitária e equilibrada por meio das
ações estatais, o que implica dizer que os fenômenos inerentes ao novo contexto
social de convivência redundam na proteção do meio ambiente urbano, cuja lógica
preventiva encerra a teoria do risco ecológico ambiental aplicado ao contexto
da urbanização social.
A
SOCIOLOGIA DO RISCO, A TUTELA COLETIVA DO AMBIENTE E A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES
UNIDAS
A medida em que o território
urbanizável das sociedades vai sendo ocupado, a preocupação com a exploração e
o uso indiscriminado dos recursos naturais ambientais vai se intensificando.
Isso se deve à equivocada interpretação comum de que temos à disposição fontes
inesgotáveis de recursos, o que nos leva a crer que seja possível estimular o
progresso e o crescimento econômico a qualquer preço.
Esse entendimento produz um
cenário panorâmico de intolerável comprometimento da sadia qualidade de vida e
do bem-estar das gerações futuras. Se a promoção de um ambiente ecologicamente
equilibrado é necessária para a construção de uma sociedade justa, fraterna e
solidária, é necessário considerar também que os riscos incidentes pela
utilização indiscriminada dos recursos vão mitigar, consequentemente, essa
arquitetura mentalmente projetada.
O Brasil dispõe de uma
estrutura protetiva jurisdicional invejável no tocante ao meio ambiente. Não
são poucos os instrumentos de política pública ou normativos destinados a
garantir o controle institucional na persecução e manejo dos efeitos provocados
pelo uso irrestrito e inadequado do meio ambiente ocupado.
Silveira (2014, p.19) afirma
que dentre os instrumentos colocados à disposição da sociedade para garantir
processualmente a gestão adequada do pleito tutelar ambiental estão: os
inquéritos, os ajustamentos de conduta, as audiências públicas, bem como, as
ações penais, civis e popular. Todavia, não se pode olvidar as Ações Diretas de
Inconstitucionalidades (ADI e ADI por omissão), o mandado de injunção, o
mandado de segurança coletivo e as Ações por Descumprimento de Preceitos
Fundamentais (ADPF).
Tangencialmente, o que se
vislumbra quando se adentra na análise do risco em razão da instrumentalização
desse ferramental é o manejo precário, insuficiente, em desfavor da
preventividade que o fenômeno necessita. A manutenção do Estado de direito é,
sobretudo, segundo Dworkin (2014, p.81), a obediência às etapas interpretativas
de um fenômeno, neste caso, o risco.
Para o filósofo
norte-americano, a integridade da interpretação de um sistema encadeado por
interpretações exige uma análise das decisões antepassadas de casos
semelhantes. A isso convencionou-se chamar de jurisprudência.
Contudo, ainda que surjam
problemas no manejo dos instrumentos jurídicos tutelares em face do risco que
não se verifica, o pragmatismo do juízo que se faz, deve estabelecer, salvo
melhor juízo, as melhores regras protetivas aos acontecimentos futuros daquilo
que se quer preservar ou proteger.
Indistintamente, é
necessário dar continuidade ao pensamento multifocal quando se articular a
retórica em favor do meio ambiente, especialmente no que tange à integridade da
proteção em favor de futuras gerações e bem-estar social urbano. Por
conseguinte, a modulação da arquitetura fenomênica do risco resulta da forma
vertical com que se apresentam os acontecimentos no tempo presente.
Os instrumentos que se
prestam a tutelar o meio ambiente, seja ele urbano ou ecológico, afiguram-se
tão apropriados, quanto todos os outros destinados ao controle e proteção de
direitos de toda natureza. Os movimentos ambientalistas possuem papel de
relevância na apuração e refino de meios processuais que permitam enaltecer o
princípio da eficiência na proteção ambiental.
Considerando que o meio
ambiente, em sentido amplo, está na órbita dos direitos e interesses difusos e
coletivos, é verdadeira a assertiva de que o Brasil viabilizou com razoável
cautela a proteção desses interesses e bens comuns de valor fundamental, os
quais são especialmente necessários à sadia qualidade de vida das gerações.
Nessa razão não se pode
olvidar a existência da constitucionalização do Estado (STERN, 2009. p.36),
cuja obrigação é provimento de meios eficazes para neutralização dos riscos
decorrentes das ações predatórias e inconsequentes dos eventos danosos ao
ambiente e à vida humana provocados, via de regra, pela ação antrópica.
A análise do risco depende de variáveis
percebidas pelo instrumento que as mensura. Para Brasiliano (1999, p.103), o
risco socialmente visível é aquele estabelecido por condições potencialmente
necessárias à provocação do dano tangível ou intangível ao patrimônio.
A percepção preventiva da
proteção deve ter por finalidade a continuidade da engenharia do fenômeno sem
que elementos externos provoquem alterações na continuidade do objetivo
fundamental do conceito original.
O meio ambiente urbano
possui mutação intensa decorrente da magnitude com que ocorre a evolução da
vida humana. O consumismo desenfreado das sociedades pós-industriais regurgita
a invocação da proteção judiciária do meio ambiente para evitar a destruição ou
a exploração indiscriminada dos recursos.
É necessário antever com
clareza os possíveis eventos que podem futuramente provocar danos ao patrimônio
ambiental no meio urbano, averiguando as condições em que isso pode ocorrer,
circunstâncias favoráveis ou desfavoráveis nas operações mercantis, atividades
lesivas realizadas pelos particulares que podem provocar a alteração do sistema
natural de sobrevivência urbana, bem como, a relação existente entre o objeto e
o potencial agente nocivo a fim de antever a ocorrência do dano e sua
concretização.
A providência não é simples,
contudo, deve a sociedade se conscientizar da importância da luta na tentativa
de minimizar ou reduzir as chances de concretude das ameaças que podem impactar
com razoável violência o equilíbrio socioambiental existente nos núcleos
sociais em que os indivíduos estão inseridos.
A redução eficaz da
probabilidade de naturalização do risco depende exclusivamente do adequado
manejo e compreensão científica de seu surgimento. Isso se mostra sumariamente
possível através de estudos técnicos de impacto ambiental antes do
desenvolvimento de atividades mercantis e industriais, que normalmente relegam
à margem tais medidas, haja vista o ônus que tais providências lhes imputam.
Não é por outro motivo,
senão, que o direito fundamental ao meio ambiente é tutelado no âmbito dos
direitos difusos e coletivos. Ou seja, qualquer um, individual ou
coletivamente, pode se valer de seu direito subjetivo de provocar o Poder
Judiciário e invocar, pelos adequados instrumentos processuais, a análise
obrigatória de condutas e ações que antevejam, ainda que minimamente,
potenciais eventos lesivos aos aspectos ambientais do habitat urbano.
Diante disso, Back (1997)
apresenta o fenômeno sociológico do risco como um paradoxo contrastante dos
aspectos das sociedades contemporâneas, onde a busca indiscriminada do
progresso da humanidade e o desenvolvimento pós-revolução industrial sem
precedentes provocaram as imediatas ameaças ao ecossistema e ao bem-estar dos
indivíduos.
Contudo, Renn (2015, p.
22-25) trata as linhas sociológicas do risco em dois vértices fundamentais. No
primeiro, estabelece parâmetros diferenciais acerca das teorias individualistas
da arquitetura do risco sob o enfoque da unidade privilegiada por cada
premissa. No segundo vértice, sustenta uma teoria estrutural.
Assim, para a teoria
individualista o ponto de enfoque são os agentes que protagonizam as condições
de incidência do risco e na teoria estrutural, onde os holofotes oculares
apontam para a atuação coletiva de influência sobre a produção do risco.
Hodiernamente, o
conceito sociológico do risco está diretamente ligado aos reflexos do fenômeno
da globalização social. Neste aspecto, os riscos, ainda que imprevisíveis, não
afastam sua face democrática e, assim, enredam sociedades e suas respectivas
classes, evoluindo analogicamente como um rio que não respeita obstáculos à sua
frente.
Pauta-se por uma
sistematização ambígua proeminente, coexistindo, a elevação das classes de
baixa renda, dos fundamentalismos religiosos, das crises econômicas e,
especialmente, das catástrofes ecológicas, como foi o caso do município mineiro
de Mariana (MG), cujas consequências abalaram toda a estrutura de
desenvolvimento daquele ecossistema, donde os resultados negativos da ausência
de previsão dos riscos irão permanecer por muitos anos, prejudicando sobretudo
as futuras gerações.
Por outro lado, Acosta
(2005, p.16-17) afirma ter sido a ação antrópica o gatilho dos desastres
tradicionalmente denominados por naturais, cujas práticas vinculam-se ao
crescimento demográfico urbano desordenado, degradação ambiental, cujos
estertores são potencializados pela desigualdade social e econômica em larga
escala.
Essas evidências foram
constatadas empiricamente por meio dos estudos de casos, que por sua vez,
invocaram a importância de se compreender o grau de exposição dos grupos
socialmente vulneráveis às ocorrências dos desastres.
O objetivo da interpretação
por eixos modulares dos referidos estudos científicos, não era outro senão
estabelecer o conceito de vulnerabilidade para a redução dos riscos por meio
das ocorrências dos desastres registrados.[6]
Assim, a percepção de que há
uma irresponsabilidade estrutural como sustentáculo dos instrumentos de
mensuração crítica da evolução teórica e prático-legislativa dos meios
processuais difusos e coletivos de proteção ambiental expõe não só a
mediocridade dos espaços já alcançados, mas, sobretudo, uma dimensão
inexplorada de criticismo intra-pedagógico.
Para Silveira (2014, p.88),
empregar a sociologia do risco na percepção do fenômeno jurídico expõe formas
institucionais de esconder a verdade, demonstrando a maximização provocada
pelos efeitos dos riscos ambientais, além da ineficiência de alcance do
arcabouço legal disponível para tutelar os direitos coletivos e difusos da
sociedade no tocante à proteção ambiental no controle e prevenção dos efeitos
nocivos do risco de catástrofes ecológicas e urbanas.
Daí decorre a assertiva de
que o fenômeno deve ser estudado além de seu espectro sociológico, porquanto
todos os núcleos sociais possuem, segundo Dworkin (2014, p.110), seus
paradigmas de direito, cujas proposições empíricas não sobrevivem se forem
contestadas. Portanto, as reflexões sociológicas dos operadores do direito se
dão no âmbito social e não fora dele. No caso do meio ambiente, o poder
influente conjuga a natureza da interpretação em favor de um bem maior,
atendendo à sadia qualidade de vida e ao bem-estar das gerações futuras.
Por tal
entendimento se justifica a aplicação efetiva da jurisdição, de maneira a
promover sem distinção o atendimento das disposições legais, quer seja no
âmbito da normativa nacional, quer seja nos códigos alienígenas, para que se
possa, de forma global, atender ao sentimento humanitário de preservação do
meio ambiente, prevenção de catástrofes ecológicas e proteção de um direito
coletivo ou difuso segundo a necessidade coletiva de auscultar o apelo da voz
da sociedade.
A ideia de
proteger direitos na órbita coletiva não é tão contemporânea assim. Mendes
(2010) esclarece que alguns referenciais históricos se consolidaram na evolução
da consciência social em diversos países, principalmente nas codificações
inglesas, nas “class action”
norte-americanas e na doutrina italiana.
Considerada o
berço dos processos coletivos, a Inglaterra medieval tem em sua história uma
aceitação espontânea por parte dos saxões daquele período, quando não havia,
segundo Silveira (2014, p.64), discussões sobre legitimidade e
representatividade social. Somente a partir do humanismo renascentista e do
crescimento da burguesia no meio ambiente urbano é que a jurisdição passou a
tutelar direitos coletivos, cujo caráter preventivo autorizava o manejo de
ações mandamentais e declaratórias em face das pretensões obrigacionais.
Em expressiva
gravidade é que a instrumentalização desse ferramental jurisdicional ainda tem
se mostrado ineficaz para controlar os riscos impedindo os desastres. A esse
respeito se questiona como a normativa existente tem proporcionado as
amarrações necessárias no âmbito das políticas públicas e suas execuções
pragmáticas diretas.
Calixto (2016,
p.103) explica que a reação da comunidade mundial em face dos desastres
ambientais que permeiam o planeta tem sido extremamente tardia, não obstante o
conjunto de metas e medidas planejadas instituídas ao longo dos últimos trinta
anos, cuja produção documental do assunto teve por finalidade a mitigação de
vulnerabilidades e o fortalecimento do conceito de cidades resilientes e
sustentáveis, com destaque para Convenção-Quadro de Hyogo, o Protocolo de
Quioto e a Declaração Rio+20.
Não é por menos
que o enfoque da ótica mundial se voltou para os riscos ambientais, provocando
o nascimento de substanciais compromissos encabeçados pela Organização Das
Nações Unidas desde 1980 em volta dessa discussão.
Ainda segundo
CALIXTO (2016, p.104), o tema é amplamente discutido nas reuniões da cúpula
mundial e no contexto preventivo e de redução dos desastres a Organização das
Nações Unidas[7]
articulou a criação da estratégia de Yokohama e sua implementação, cujas
medidas deram origem ao Secretariado Interagências de Prevenção do Risco de
Desastres – UNISDR, centralizando, assim, as estratégias da comunidade
internacional no que tange a prevenção de riscos aos desastres ambientais.
A Organização
tem mostrado papel ativo e relevante na instituição de instrumentos de controle
e resoluções normativas corroboradas pelos países membros da cúpula. Em 2005 na
conferência mundial para redução de desastres sedimentou-se a Declaração de
Hyogo[8], cujo Protocolo foi
subscrito por nada mais, nada menos, que 160 países, dentre os quais, o Brasil,
cuja vigência perdurou de 2005 a 2015.
Nas palavras do
secretário geral – Ban Ki-moon, foi da necessidade de equilibrar os imperativos
do crescimento econômico das nações, com a obrigatoriedade de conservação dos
recursos naturais mais importantes do planeta, que os líderes mundiais,
reunidos no Brasil, estabeleceram a 20 anos na “Cúpula da Terra”[9], o rompimento do antigo
modelo econômico e passaram a estabelecer as bases de um novo modelo a partir
do desenvolvimento sustentável.[10]
As disposições
da referida declaração restaram reafirmadas na Rio+20[11], que teve por objetivo
renovar o compromisso dos estados signatários com o desenvolvimento sustentável
através do crescimento equilibrado e da implementação das decisões convergentes
em torno da proteção ambiental e o tratamento adequado de temas acessórios
emergentes acerca dos riscos de destruição do meio ambiente.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
O discernimento social é um
ato de inteligência emocional do indivíduo. As prioridades escolhidas pela
sociedade, salvo raras exceções, têm sido pouco qualificadas para orientação
socioambiental dos vetores que conduzem à vida contemporânea.
A necessidade do respeito às
questões relacionadas aos riscos vivenciados pelas pessoas e projetados nos
acontecimentos panorâmicos futuros, amoldam-se pela insensatez da necessidade
desenfreada progressista e por interesses pessoais consubstanciados nas
escolhas de representatividade do poder.
É como se os limites
impostos pelos riscos sociais e inimagináveis que atualmente participam
integralmente da vida social fossem o endosso de um cheque em branco para que a
qualquer custo fosse possível suprimir a realidade dos acontecimentos em favor
de um mal maior.
De nada tem adiantado os
alertas ambientais, porquanto, indiscutivelmente o ser é diferente do dever
ser.
O despreparo técnico da
maioria dos responsáveis pela produção legislativa do arcabouço jurídico que
protege o meio ambiente, tem provocado a marginalização dos alertas éticos,
culturais, científicos e sociais da realidade que se conforma rapidamente no
contexto de globalização vivenciado pela humanidade.
Não obstante, é sobretudo a
preocupação com os instrumentos de proteção social dos direitos ambientais e
humanos que conduzem os estudos científicos ao manejo equilibrado dos riscos
inerentes à realidade globalizada da população. Isso porque o cuidado com os
direitos humanos e ambientais são essencialmente necessários à garantia da
melhor qualidade de vida sadia no planeta.
É fundamental o alcance da
sustentabilidade ecológica nos aspectos referentes ao ambiente, o qual será
possível, por exemplo, orientar melhor o direito de propriedade, promovendo o
equilíbrio dos riscos inerentes a esse direito.
A superioridade da
importância dispensada com o desenvolvimento sustentável invoca uma abordagem
séria e despida de conceitos e interesses individuais que possam alterar a
matriz mundial de preservação e controle dos aspectos das sociedades de risco.
Trata-se de um regime unificado de prudência, de obrigações e de abrangência de
direitos humanos em prol de um desenvolvimento sustentável.
A preocupação deve estar
diretamente relacionada à forma como se constitui a concepção supranacional dos
direitos humanos ambientais, do desenvolvimento sustentável e seus reais
elementos, bem como a conformação moderna das sociedades do risco.
Isso porque, em cada nível
internacional se opera uma preocupação diferente das intenções que se
complementam, ou seja, cada sociedade aborda o risco, o desenvolvimento
sustentável e os direitos humanos ambientais à sua maneira e de acordo com sua
realidade.
Não é por menos que para
cada conformação, ainda que aplicável as teorias tradicionais, encontramos
ordenamentos jurídicos que amparam de forma diversa os aspectos mais relevantes
do conceito de risco. O referencial teórico que baliza a questão da sociedade
do risco, do desenvolvimento sustentável e seus direitos naturais intimamente
ligados são, sobretudo, um instrumento metodológico apto a identificar um
conjunto significativo de direitos contemporâneos socioambientais.
Assim, é necessário que as
medidas adotadas para garantia dos direitos naturais da humanidade – direitos humanos
– em relação ao desenvolvimento sustentável e a preservação de seus recursos,
cuja estrutura possui efetiva ligação com a constituição de seus conceitos,
demonstre a integração plena da biosfera e do valor obrigacional dos elementos
que os orbitam.
Por fim, é necessário que o
conjunto de medidas destinadas ao crescimento social e econômico de cada nação,
integre, efetiva e permanentemente, o discurso de proteção ambiental,
desenvolvimento sustentável e equilibro ecológico às medidas de prevenção e aferição
dos riscos e seus impactos ambientais.
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[1] Mestrando em Direito Ambiental na
Universidade de Caxias do Sul – UCS. Advogado. Membro do Instituto dos Advogados de Santa Catarina. Pesquisador CNPq nas áreas de Teoria do Direito, Teoria Social e Meio Ambiente - grupo Direito Ambiental Crítico. Currículo Lattes:
http://lattes.cnpq.br/5138326964068427. E-mail: aulus.sc@gmail.com
[2] Mestrando em Direito Ambiental na
Universidade de Caxias do Sul – UCS. Taxista CAPES. Currículo Lattes:
http://lattes.cnpq.br/7083546133472274. E-mail: gsdanieli@ucs.br
[3] Mestranda em Direito Ambiental pela
Universidade de Caxias do Sul/RS. Especialista
em Direito Público pelo programa
de pós graduação em direito convênio Universidade de Caxias do Sul – Escola
Superior da Magistratura Federal – ESMAFE/RS. Servidora Pública do Município de
Caxias do Sul. Advogada. Conciliadora Cível na Comarca de Flores da Cunha/RS.
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/4723808454178892. E-mail:
rubianegaliotto@gmail.com
[4] Convenção de Åarhus – UNITED NATIONS ECONOMIC COMMISSION FOR EUROPE.
Convention on access to information, public participation in decision – making
and access to justice in environmental matters done at Åarhus, Denmark, on 25
June 1998. Disponível
em: <http://www.unece.org/env/pp/documents/cep43e.pdf>. Acesso em: 28
mai. 2017.
[5] No pensamento de
Foucault - 1926-1984, o paradigma geral segundo o qual se estruturam, em uma
determinada época, os múltiplos saberes científicos, que por esta razão
compartilham, a despeito de suas especificidades e diferentes objetos,
determinadas formas ou características gerais [O surgimento de uma nova
episteme estabelece uma drástica ruptura epistemológica que abole a totalidade
dos métodos e pressupostos cognitivos anteriores, o que implica uma concepção
fragmentária e não evolucionista da história da ciência.]
[6] Por
otro lado, la creciente evidencia derivada de estudios de caso, de que muchos
de los desastres tradicionalmente atribuidos a causas naturales eran generados,
em buena parte, por prácticas humanas relacionadas com la degradación
ambiental, el crecimiento demográfico y los procesos de urbanización, todos
éstos vinculados em gran medida com el incremiento de la desigualdad
socioeconomicas a escala local, regional, nacional y, desde luego,
internacional [...] Estas evidencias empíricas llevaron a la necesidad de
conceptualizar las probabilidad de la exposición del ocorrencia de desastres de
grupos sociales caracterizados por uma elevada vulnerabilidad. Este concepto,
ay por su utilidad analitica, empezo a permear y, pronto, a dominar, como eje
modular en los estudios sobre desastres. Resulta evidente que el concepto de
vulnerabilidad resultó necesario em función del interés por trabajar en la
reducción de la ocurrencia del desastres. (Tradução própria).
[7] A Organização das Nações Unidas (ONU) é uma organização
intergovernamental instituída com a finalidade de fomentar a cooperação
internacional e tem por objetivos, a manutenção da segurança e da paz mundial
através da garantia dos direitos humanos, auxiliando no desenvolvimento
econômico e progresso social, além da proteção do meio ambiente e do
atendimento humanitário em casos desastres naturais e conflitos armados.
[8] Documento político de natureza política que define as responsabilidades dos
estados em proteger as populações dos desastres e apresenta o pensamento
estratégico internacional destinado à promoção emergente da cultura preventiva
fundada na redução das vulnerabilidades.
[9] Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente,
conhecida como “Eco-92” (13/06/1992), cujo objetivo reuniu 108 chefes de Estado
em busca de soluções para conservação dos recursos naturais do planeta. Seus
conceitos foram fomentados em 1972, quando a ONU realizou sua primeira
conferência ambiental, em Estocolmo.
[10]
Twenty years ago, there was the Earth Summit. Gathering in Rio de Janeiro,
world leaders agreed on an ambitious blueprint for a more secure future. They
sought to balance the imperatives of robust economic growth and the needs of a
growing population against the ecological necessity to conserve our planet’s
most precious resources — land, air and water. And they agreed that the only
way to do this was to break with the old economic model and invent a new one. They called it
sustainable development.(tradução própria).
[11] A Rio+20 (Conferência
das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável), foi realizada de 13 a 22
de junho de 2012, na cidade do Rio de Janeiro. Foi assim conhecida porque
marcou os vinte anos de realização da Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92) e contribuiu para definir a agenda do
desenvolvimento sustentável para as próximas décadas.
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