O
LIMITE DA RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA NOS CRIMES AMBIENTAIS
EL LÍMITE DE LA RESPONSABILIDAD PENAL DE LA PERSONA
JURÍDICA EN DELITOS AMBIENTALES.
Aulus Eduardo Teixeira de Souza[1]
RESUMO
A análise da responsabilidade penal objetiva ou
subjetiva da pessoa jurídica nos delitos ambientais faz do presente artigo um
complemento para a literatura cientifica de vanguarda que aborda a temática.
Neste, buscamos apresentar, elementar ponto de vista, cuja abordagem trata do
arcabouço jurídico que tutela a questão, o posicionamento, ainda que amplamente
discutido, bastante divergente nas Cortes superiores do país e a os aspectos
que condicionam a matéria a instigante estudo. Através da pesquisa bibliográfica
e documental, o trabalho se debruça sobre a instrumentalização operativa da
estrutura de criminalização da pessoa jurídica nos delitos ambientais, tanto
quanto a pormenorização dos aspectos objetivos e subjetivos da aplicação
dogmática do processual criminalizante. Sob a ótica contemporanea de aplicação
da legislação em favor da proteção e o meio ambiente, o texto vislumbra os
arredores principiológicos da exegese da imputabilidade criminal nos fatos
tipicamente ambientais que invocam a tutela do direito penal, no íntimo da
proteção do meio ambiente. Por premissa mestra, está a proteção do bem comum a
humanidade, cuja temática, a despeito de sua relevância supra fundamental,
ainda provoca discussões acaloradas e divergentes sobre a possibilidade ou não
de responsabilização das pessoas jurídicas, em detrimento ou não, das pessoas
naturais que as dirigem, no cometimento de crimes tipificados na legislação de
proteção ambiental, bem como nas disposições da Constituição Federal de 1988.
Palavras-chaves: Direto penal; meio ambiente;
pessoa jurídica; crimes ambientais.
RESUMEN
El análisis de la
responsabilidad penal objetiva o subjetiva de las personas jurídicas en los
delitos ambientales hace que este artículo un complemento a la literatura
científica de vanguardia que aborda el tema. En este, se busca presentar, punto
de vista, cuyo enfoque es el marco legal que supervisa la emisión, colocación
primaria, aunque ampliamente discutido, bastante divergentes en los tramos
superiores del país y de los aspectos que influyen en el asunto al estudio de
la reflexión. A través de la investigación bibliográfica y documental, el
trabajo se centra en la explotación operativa de la estructura de la
penalización de la persona jurídica en delitos ambientales, así como la precisión
de los aspectos objetivos y subjetivos de la aplicación dogmática de la
penalización de procedimiento. En virtud de la aplicación de la perspectiva
contemporánea a favor de la protección y el medio ambiente, el texto contempla
los principiológicos afueras de la responsabilidad penal en la exégesis hechos
típicamente ambientales que invocan la protección de las leyes penales, en las
profundidades de la protección del medio ambiente. Por premisa principal es la
protección del bien común de la humanidad, cuyo tema, a pesar de su importancia
supra fundamental, que aún provoca fuertes discusiones y divergentes acerca de
si o no la responsabilidad de las personas jurídicas, en detrimento o no, las
personas físicas la unidad, en la comisión de delitos específicos en la
legislación de protección ambiental y las disposiciones de la constitución
Federal de 1988.
Contraseñas:
Derecho penal; medio ambiente; personas juridicas; delitos ambientales.
1. INTRODUÇÃO
De certa maneira,
talvez seja possível afirmar em tempos hodiernos que o direito almeja a
sistematização social das condutas humanas como forma garantidora do controle
dos desvios que esquadram a margem do limite aceitável das ações de um grupo de
pessoas.
Em meio ao caos
interativo promovido pelo avanço do progresso em detrimento do bem-estar
natural da sociedade, o estado procura às escuras, uma forma incontroversa de
sanear o controle dos atos e condutas de seus estertores sociais, cuja
oxigenação jas mecanizada pelo
colapso da profusão normativa criminal submersa à pressão sócio-política da
humanidade globalizada pelo advento tecnológico dos meios de mídia e
comunicação em massa, os quais reivindicam a proteção em modalidade inovadora
para que a eficiência estatal delegada pela soberania popular não se torne
obsoleta em face do cidadão e da proteção que lhe deve ser proporcionada na
preventividade das ações no ambiente em que habita.
Shecaira (1998, p. 131)
afirma que o crescimento demográfico e o êxodo domiciliar urbano são os grandes
responsáveis pelo imenso poder exercido pelas metrópoles no realocamento do cidadão,
justificado pela necessidade de progredir, para as adjacências de seu ambiente
domiciliar.
Possivelmente isso tem
sido o gatilho propulsor das medidas emergenciais destinadas a aferir os pesos
de maneabilidade das condutas que causam prejuízos em larga escala e dimensão
considerável na destruição do meio ambiente. Revolvendo as areias do tempo,
extraímos da revolução industrial as necessidades de controle dos meios de
produção e das atividades neófitas das pessoas jurídicas embrionárias.
A interação empresarial
equivocada decorrente daquele período, provocou a metástase de um corpo chamado
estado, cuja essência deveria, por lógica de seu poder “delegado”, atender as
expectativas do indivíduo na adequada emergente promoção da interação e
bem-estar, com equilíbrio e sabedoria na proteção do ambiente habitacional
ecologicamente urbano. Apesar de não se poder sentenciar a culpabilidade desta
silenciosa derrocada a forma moderna de se viver, sabe-se que este aspecto tem
elevada influencia nociva nas questões que submetem o enredo de
responsabilização penal da pessoa jurídica.
Esse paradigma de
convívio social, denominado modernidade, trouxe consigo, não apenas, novos
modos de viver, mas também, novas maneiras de cogitar o tutelamento dos
direitos individuais e coletivos, bem como, novos bens e agentes a serem
inteirados pela norma. Junge-se, portanto, que a consagração da democracia sob
o império das leis deve aprofundar-se na amplitude de novos conceitos e
institutos que visem o garantismo jurisdicional, em último caso, da proteção ao
patrimônio ecológico, quando este for alvo de ofensa material ou potencialmente
abstrata pelo preço da racionalização critica destinada ao fomento do bem
social e ecológico da fauna, da flora e da biodiversidade ampla.
A conformação dos
fenômenos sociais adstritas a realidade substantiva da tutela ambiental, exige
do direito um real acompanhamento epistêmico e dogmático para tutelar as mutações
sociais no âmbito das medidas protetivas ecológicas. O vetor desta ocorrência
é, sem dúvida, a manutenção da sagrada harmonia entre o homem e seu habitat.
Diante da irresponsável
e eminente possibilidade que assombra a evolução da humanidade, em que as ações
predatórias do homem em favor de benefícios fúteis de materialidade e conforto,
travestido de progresso humanizado provocam a extinção do bem mais precioso que
se tem notícia, a vida, mostra-se razoável a criação de um ordenamento jurídico
que criminalize as ações inadequadas do homem por seus entes virtuais, cujo
objetivo é a obtenção de lucro, fomentando o trabalho e os meios de produção,
denominado pessoa jurídica.
Sua existência projeta
no ambiente em que são instaladas profundas e relevantes modificações,
porquanto, na intenção de preencher as lacunas do desemprego, da fome, da
geração de renda e riquezas, os meios de capital realizam o enfrentamento em
boa parte das vezes, da ocupação harmoniosa do homem e o meio ambiente
ecológico, de forma sustentável e equitativa.
É na compreensão de
Shecaira (1998, p. 131) que a vertiginosa evolução dos meios de comunicação e tecnologia
desencadeiam verdadeira hecatombe da expansão da polis como instrumento de
potencialização do cometimento de delitos, em especial o desbravamento da
destruição do meio ambiente pela ação das pessoas jurídicas, sejam elas, de
direito privado ou público.
Mesmo o Direito penal,
excepciona a realidade do sistema punitivo quando se trata de crimes ambientes
realizados por pessoas jurídicas. Neste caso a criminalização ocorre sem a
severidade do efetivo sistema processual penal, que insere na condição de menor
potencial ofensivo os crimes ambientais realizados pelas empresas. Mas, como
deveria ser mensurado o grau potencial de ofensa à vida na destruição ou
depredação dos biomas e biotas existentes pelo planeta?
Os mesmos mecanismos de
prevenção social e redução da criminalidade precisam de manejo adequada para se
amoldarem aos delitos cometidos contra o meio ambiente pelas empresas, haja
vista a responsabilização das pessoas jurídicas ser uma realidade enfrentada
pela sociedade moderna, inclusive por ter sido, o meio ambiente, alçado como
relevante bem, a ser tutelado em favor dos direitos difusos e coletivos da
comunidade planetária.
Não é segredo que o
atual modelo de economia capitalista praticado e absorto na busca sistêmica dos
benefícios do lucro estabelecem a direção da vida comum moderna. Portanto, a
hipertrofia observada nas corporações de grande porte, por exemplo, as quais
atravessam os limites fronteiriços do estado com sua atuação, invocam maior
cautela no manejo de suas operações, que tem trazido por maioria esmagadora
impactos negativos ao meio ambiente.
A discussão se amplia
para invocar o princípio da dupla imputação penal e suas impressões no contexto
fático de aplicação da lei de crimes ambientais, porquanto, se faz necessário a
criação de medidas cada vez mais amplas para tutelar as condutas socialmente
repreensíveis no maior alcance da normativa penal, e por isso, se busca
alcançar neste caso, as pessoas jurídicas e seus responsáveis ou
representantes.
2. O
CARÁTER HEGEMÔNICO DA NORMA PROTETIVA AMBIENTAL SOBRE OS ILÍCITOS COMETIDOS
CONTRA O MEIO AMBIENTE
Hegemonia pressupõe superioridade,
no caso, o contexto normativo em que a questão é tratada está mais
objetivamente descrita na Constituição Federal de 1988 e na Lei nº 9.605/98 (Lei
de crimes ambientais), cuja finalidade é revestir de amplitude soberana a
predominância das ações estatais pautadas na legalidade em face dos crimes
ambientais cometidos por pessoa jurídica ou seus responsáveis.
Em que pese a expressa previsão da
responsabilização das pessoas jurídicas na carta política, parte dos
doutrinadores ainda não se renderam a possibilidade de responsabilização de um
ente fictício, como é o caso das sociedades. O texto constitucional dispõe que
“as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitará o
infrator, pessoa física ou jurídica, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados”[2], pois bem, no topo da
pirâmide de Kelsen jaz a bandeira da expressa previsão legal, contudo, a
celeuma está intimamente relacionada com a ideia de que um ente fictício não
preenche os requisitos para a penal responsabilização, ou seja, a discussão é
doutrinária.
Se o espírito da lei
disposto no capítulo VI, do título VIII do texto constitucional fosse
compreendido pelo seu caráter supraconstitucional implícito, as correntes
doutrinárias divergentes da responsabilização penal não ganhariam força. Ter
direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e essencial a sadia
qualidade de vida das pessoas, pressupõe medidas e ações necessárias a
manutenção desse equilíbrio e, por conseguinte, quaisquer atividades ou ações
realizadas por pessoa física ou jurídica que destruam ou deixem de preservar o
bem jurídico, aqui tutelado, deve ser amplamente combatida.
Basta uma análise
apurada do conjunto da obra disposta no art. 225 e seus parágrafos, para
incorporar o espírito do legislador constituinte quando descreveu o texto ali
adensado. A hegemonia da supremacia do texto constitucional impõe ao poder
público a preservação e restauração dos processos ecológicos prejudicados do
patrimônio genético da fauna e da flora nacional.
Define os componentes
ambientais que merecem especial proteção, e exige na forma da lei, estudo
prévio de impacto ambiental para manejo de atividade potencialmente causadora
de significativa degradação. Invocando, inclusive, o controle de produção e
comercialização de substâncias que sejam nocivas ao meio ambiente e à qualidade
de vida das pessoas.
A atitude contumaz morfológica
das empresas movida pela busca desenfreada do lucro capitalista através dos
meios de produção, tem provocado evidente distanciamento da intenção do
legislador quando estabeleceu medidas notórias no texto constitucional para
proteger o ambiente em que as pessoas vivem e sobrevivem.
Não se pode curvar a
espinha dorsal das medidas impostas na carta política e chancelada em
legislação diversa, ante os interesses minoritários de certas castas, aquém da
preservação da vida e do meio ambiente. Além de tudo isso, o poder público tem
o dever de proteger os biomas criminalizando as condutas que coloquem em risco
sua função ecológica e possam a curto, médio ou longo prazo, provocar a
extinção das espécies e a destruição do meio ambiente.
As condutas
consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitam os infratores, se pessoas físicas
naturais, às sanções penais, se pessoas jurídicas fictícias, às sanções administrativas,
independente da obrigação reparatória do dano provocado. Nesse razoável
entendimento, não se pode olvidar, a virtualidade das empresas, que assomadas
pela teoria da realidade técnica limita o alcance as ações predatórias desses
entes.
Não é por menos que o
termo “pessoa jurídica”, descrito no
Código Civil Brasileiro e aceito por unanimidade doutrinária, bem como, o termo
“pessoa coletiva”, utilizado e aceito
pelo direito luso português[3], valem-se da mesma base
estrutural para determinar a designação de entidade virtual que se amolda na
forma personificada detentora de direitos e obrigações e, se assim o é, também
atrai para si, por ação reflexa as responsabilizações por seus atos.
A existência legal das
pessoas jurídicas de direito privado, por exemplo, toma forma com seu registro
de constituição no órgão pertinente, ressalvada em alguns casos, a autorização
do poder público, exigindo-se a averbação de seus atos posteriores do ato
constitutivo.[4]
Reforçando a argumentação, os atos dos administradores do ente virtual, nos
limites dos poderes a eles constituídos e descritos estatutariamente, obrigam a
pessoa jurídica a responder em por todos os atos como se dela fossem. Temos aí,
o instituto da concretização da vontade real do ente fictício.
Esclarece Clóvis Bevilacqua
(1929, p. 158), dentre suas definições de pessoa jurídica, que um agrupamento
de homens que se reúnem para determinado fim, buscando auferir lucro das
específicas atividades empresariais, demonstrando vida própria ao ente
conformado pelo conjunto de seus componentes, cuja manifestação é distinta de
tais indivíduos, necessitam especial proteção do direito e do ordenamento para
a segurança desse ente.
A Lei federal nº 9.605
de 1992, editada com a finalidade de aplicar sanções penais e administrativas,
à pessoa física natural e/ou às atividades de pessoa jurídica fictícia e/ou
coletiva, cujas condutas sejam lesivas ou nocivas ao meio ambiente, apresenta
conteúdo complementar e sinérgico ao disposto no art. 225, §3º da Constituição
Federal.
Todas as condutas ali
tipificadas como crime, ou seja, de responsabilização penal, só podem ser
concretizadas, executadas efetivamente, por pessoa natural, por um ser humano
ou no mínimo, seus atos preparatórios. Não se quer aqui remir a
responsabilização penal das empresas ante os atos de irresponsabilidade no
manejo de suas atividades, porém, esclarecer que a única pena efetiva possível
de ser aplicada aos entes fictícios, por óbvio, é a pena pecuniária ou a pena
restritiva de direitos, e neste caso, é perfeitamente possível a
responsabilização.
Dispõe a Constituição
Federal que a lei estabelecerá a responsabilidade das pessoas jurídicas,
sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza.[5] Contudo, o rompimento da
impunidade das empresas no tocante aos crimes ambientais exaure-se no marco
constitucional que rompeu a ordem jurídica em 1988. Afirma Martins e Bastos
(1990, p.103) que o §3º, do artigo 225 do texto constitucional entabulou a
punibilidade criminal das pessoas jurídicas e a teor disso irrompeu-se a
discussão doutrinária acerca dos elementos subjetivos componentes das condutas
passíveis de criminalização.
Ainda que se possa
vislumbrar um posicionamento de vanguarda da norma criminal, a cautela é
substancialmente necessária neste caso, porquanto, se ausente um dos
componentes necessários a caracterização subjetiva da conduta abstrata descrita
na norma, então, extingue-se a punibilidade do agente, podendo penalizar a
conduta realizada como infração administrativa sui generis aplicando-se a restrição de direitos e/ou reparação
pecuniária.
Não se pode inventar
regras no direito penal sob pena de afrontar direitos importantes e consagrados
do ordenamento jurídico. A aplicação precipitada pode ferir o direito à
liberdade das pessoas vinculadas à pessoa jurídica, dentre sócios e acionistas.
A questão é se a criminalização das condutas das pessoas jurídicas, no contexto
da responsabilização penal pelos crimes ambientais, pode ser proposta como
norma penal ou seria necessário interpretar esse caráter criminalizante e
aplicá-la como restrição de direitos ou reparação pecuniária, à margem do
direito criminal, ainda que a conduta praticada por pessoa jurídica seja crime?
A despeito da notoriedade
trazida pela hegemonia constitucional acerca da possibilidade de
responsabilização da pessoa jurídica, ao infirmar que a lesividade das ações causadoras
de danos ao meio ambiente provocadas por esses entes, sujeitará o infrator, no
caso, as empresas, às sanções penais, invocam a lei aplicável às condutas abstratas, cujas condutas tem como
origem, na razão de sua existência, a ação do ser humano.
Mesmo as ações das
empresas são originadas em comandos e condutas humanas, e não o inverso. Daí se
dizer que, ante a possibilidade de responsabilização penal da pessoa coletiva, encarar-se-á
a conduta como crime passível de consequente restrição de direitos ou reparação
pecuniária, porém amparado por infração de cunho criminal sui generis, não descrita no Código Penal, mas, na Lei de crimes
ambientais.
Nesse sentido seus
componentes são um pouco distintos daqueles que tipificam a conduta humana,
haja vista a inexistência da vontade, elemento essencial para caracterizar a
ação criminosa.
3. A
DIVERGÊNCIA DOUTRINÁRIA ACERCA DA RESPONSABILIZAÇÃO PENAL DA PESSOA JURÍDICA
NOS CRIMES AMBIENTAIS E OS ELEMENTOS CRIMINALIZANTES DA CONDUTA
Como se sabe, o
instituto da responsabilização penal das pessoas jurídicas em crimes
ambientais, cujos delitos eram anteriormente tratados no âmbito administrativo,
no máximo talvez, nas contravenções, hoje se insere nos anais do direito penal
contemporâneo, cuja normatização se amolda em leis esparsas, especialmente na
Lei nº 9.605 de 1998. Inspirado nas cátedras do direito romano germânico, esse
instituto advém do modelo francês, cujo paradigma levou muitos anos para
adaptação naquele país.
O que se verifica no
Brasil, é a divergência doutrinária acerca da temática, que invocando os
artigos 173, §5º e 225, §3º do texto constitucional apontam cada qual a sua
razão para responsabilizar ou não penalmente as pessoas coletivas pelas
condutas ilícitas em matéria ambiental. De um lado Capelli (1996, p. 104)
afirma ser incontroverso a previsibilidade de tal responsabilidade na Carta
Política, porquanto, seria um desproposito que os referidos dispositivos
constitucionais viessem apenas para sustentar a responsabilidade penal pelos
crimes ambientais apenas de pessoas naturais.
Contudo, Prado (1992,
p. 32) e Coelho (1998, p.48) divergem severamente em relação àquele
posicionamento, apontam que o texto republicano é notório ao infirmar o
desmembramento das ações, para os doutrinadores, a lei modula as condutas às pessoas
naturais e as atividades às pessoas jurídicas, estabelecendo àquelas sanções
penais e a estas sanções administrativas.
Não se mostra nada razoável,
ante a relevância e polêmica provocada pela matéria, tratar deste tipo de
responsabilização, no âmbito dos crimes contra a ordem econômica e financeira
como ocorre como art. 173, §5º da Carta Constituinte. No entanto, Branco (2001,
p. 59) afirma inexistir dúvidas de que o legislador, ao tratar da questão, teve
por objetivo estender a responsabilização das empresas para além de seus
dirigentes, lhes revestindo também da responsabilização civil e financeira ante
o cometimento de crimes ambientais que afetem a ordem financeira e a economia
popular.
Assim, é bastante
razoável afirmar que de fato há certa consagração, pelo texto constitucional,
da responsabilização penal das pessoas jurídicas de direito público ou privado pelo
cometimento de crimes ambientais. O apelo social em favor das ações protetivas
ao meio ambiente tem forçado o poder público a se manifestar apresentando
providências severas àqueles que destroem ou causam danos ao ambiente ecológico
do planeta.
Forçosa à análise da
definição e conceituação de crime na conformação do ordenamento jurídico
tupiniquim. De acordo com a lei penal, considerar-se-á crime a conduta
tipificada descrita na norma, cominada com o cerceamento da liberdade por
reclusão ou detenção, cumulativamente ou não, com penalização pecuniária. Já,
contravenção é aquela cuja pena será a simples prisão ou multa. Verifica-se
apenas a distinção das definições semânticas das condutas ilícitas, contudo,
para legitimar a responsabilização penal das pessoas jurídicas é mister seja
feito a análise dos conceitos trazidos pela doutrina.
Sinteticamente verifica-se
que o conceito de “crime” é instrumentalizado sob o ponto de vista material,
formal e analítico.[6] Quanto a este, fragmenta-se em duas vertentes
ou “teorias” denominadas “bipartida” – fato típico e antijurídico, (LAUZID,
2002, p. 82) e “tripartida” – fato típico, antijurídico e culpável, (BITENCOURT,
2011, p. 253). Para ambas, é incontroverso que crime é fato típico e
antijurídico, haja vista a divergência estar na culpabilidade, pelo que não
iremos elastecer a celeuma sobre esse pressuposto.
A ação do agente poderá se dar sob duas
formas, a dolosa ou a culposa, no entanto, para que se configure efetivamente
um crime, são necessários quatro vetores fundamentais, a conduta voluntária
(vontade independente), resultado, nexo causal e tipicidade. Ausente quaisquer
um desses vetores, inexistirá o crime. Ainda que os conceitos sejam observados
pelo enfoque da teoria finalista, ou seja, imperativo que haja um resultado, se
inexistir um dos demais vetores, também inexistirá o crime.
Diante disso, existindo
uma conduta concreta abstratamente vedada pela norma, temos a tipicidade. Logo,
se houver o liame conectivo (nexo causal) entre a prática voluntária (vontade)
de conduta descrita abstratamente na norma, que após sua concretização
(tipicidade), produza um resultado reprovável penalmente, então temos aí o
cometimento de um crime doloso ou culposo. O dolo subsiste quando o agente
pratica direta ou indiretamente o crime com vontade consciente de alcançar o
resultado proibido pela norma. Já a culpa, decorre das elementares de
imprudência, imperícia ou negligência, as quais não iremos abordar no trabalho
apresentado.
O caráter ilícito ou
antijurídico da conduta decorre da prática de todas as ações do agente que
sejam contrárias a norma penal. Ensina Mirabete (2004, p. 119-120) que a
antijuridicidade pode ser conceituada como a colisão entre a norma e a conduta.
O Fato por si só é um fato apenas, contudo, conformando-se à conduta típica
extraída da lei penal, temos aí sua antijuridicidade.
Não se pode olvidar que
existem circunstâncias que provocam o desaparecimento da ilicitude ou
antijuridicidade da conduta proibida, as quais estão descritas no Código Penal.[7] O apontamento em riste se
faz necessário para argumentar que o abate de animal para saciedade da fome do
agente ou sua prole e o assassinato de um animal em extinção para evitar que
este ataque e mate seu algoz, poderia constituir-se em estado de necessidade e
legítima defesa, respectivamente.
Mas, no caso da pessoa
jurídica, a discussão é muito mais complexa pois, inexiste uma conduta
voluntária consciente, mas, uma conduta induzida por seus gestores.
4. O
LIMITE DA POSSIBILIDADE JURÍDICA DA RESPONSABILIZAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA POR
CRIME AMBIENTAL
Dispõe a Lei[8] que a
responsabilização da pessoa jurídica se efetiva em todas as esferas, seja ela,
administrativa, civil ou criminal, não excluindo a responsabilidade de pessoas
físicas – autoras, partícipes ou coautoras – que tenham atuado em benefício ou
interesse da entidade. O texto legal destaca ser necessário para a consequente
responsabilização da pessoa jurídica, decisão de seu representante legal ou
órgão colegiado em benefício da entidade, com lastro nesse notório
entendimento, os entes fictos, ainda que possuam personalidade jurídica
própria, não gozam de vontade voluntária e consciente, haja vista não serem
seres humanos.
É imperioso que a responsabilização
das pessoas jurídicas seja analisada sob a ótica do concurso de agentes, vez
que esses entes somente se manifestam por ação original de seus representantes.
A coluna central da responsabilização penal aos delinquentes, é a retirada
destes do convívio social, haja vista a inclinação de realizar condutas
reprováveis pela sociedade em nível necessário de intervenção estatal, que age
na condição de garante do cumprimento da vontade delegada pela sociedade de
perseguir a retidão e o efetivo cumprimento da norma.
Entretanto, inexiste a tal
possibilidade para pessoas jurídicas. As pessoas coletivas estão sujeitas a
penas de responsabilidade e reflexas de direito, ou seja, ou submete-se a
reparação pecuniária ou a perda de direitos que lhe são inerentes. Assim, a
existência da criminalização provoca uma discussão praticamente inócua que,
condensado pelo apelo social na busca de culpados, alcançará seus gestores, e
por consequente terão dupla responsabilização.
A primeira por ter ordenado ou
coordenado as ações delituosas da pessoa ficta, a segunda, pela pena pecuniária
ou restritiva de direitos que esta virá a ter. sobejamente claro que os
dispositivos legais delimitam a responsabilização penal desses entes, no
entanto, as disposições processuais de manejo e aplicabilidade dessa realidade
não se fez acompanhar pelo códex e assim, inviabilizaram a prestação
jurisdicional.
Em que pese a consideração de que as
pessoas jurídicas são concebidas como sujeito de direitos e obrigações e,
portanto, sua personificação se efetiva no campo jurídico-ideológico,
distintivamente de seus representantes, sua incorporação ao mundo concreto ocorre
segundo a teoria da realidade técnica[9], diante
disso a conduta delitiva não se configura, haja vista a vontade coletiva que
lhe apraz ser efetivamente desencadeada pelos seus gestores indissociavelmente.
Toda sorte, a coerência de
penalização da pessoa jurídica só se revela adequada àquelas de direito privado
quando o delito é cometido para seu proveito, porquanto, o legislador calou-se
ante a responsabilização do estado por suas ações delituosas que provoquem
danos ao meio ambiente no cometimento de crimes assim tipificados, guardando-se
a pertinente ressalva acerca da responsabilidade de seus gestores.
A responsabilização sob o enfoque do concurso de agentes
está alinhada com o Código Penal[10],
pois este é taxativo ao afirmar que a concorrência, sob qualquer forma e modo,
de quem quer que seja, incide o agente nas penas cominadas ao tipo penal nos
limites de sua culpabilidade.
Entendimento comungado
pela Lei de crimes ambientais[11] que disciplinou a questão
em seu artigo 2º estabelecendo que os gestores, administradores, diretores,
mandatários de pessoa jurídica entre outros, respondem criminalmente por
omissão quando podendo deixarem de agir diante de conduta ambientalmente
criminosa.
Todas as condutas descritas têm origem na ação humana e,
portanto, optou-se pela responsabilização por ricochete ou reflexa, onde,
sempre que houver no polo passivo da ação penal uma pessoa jurídica, haverá
também uma pessoa física. Ainda que seja aceitável a possibilidade de
responsabilização penal de pessoas físicas e jurídicas pelo cometimento de
crimes ambientais, cuja consequência poderá ser o sancionamento civil,
administrativo e penal, a imputabilidade penal das pessoas coletivas se revela
prejudicada, haja vista seu espectro ser taxativamente humano (PRADO, 2001, p.
150).
Assim, a lei penal ambiental brasileira está adstrita as
ações da pessoa natural, e portanto, reforçam a tese de impossibilidade
relativa de responsabilização pela ausência de vontade consciente desta na
prática do delito, na prática apenas penas restritivas de direitos e penas pecuniárias
poderiam ser aplicáveis, haja vista, tratar-se de um ente ficto, porquanto,
apenas o ser humano possui o animus
para a pratica do delito penal ambiental e nesse viés, não se cogita a
ressocialização do agente, mas sim a reparação do dano.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na prática, a lei de crimes ambientais tem logrado êxito em
grande parte de seu objetivo que é a proteção da fauna e da flora, do meio
ambiente em si. Os preceitos constitucionais invocados a partir do artigo 225
da Carta Política tem viabilizado ao estado atender aos anseios da sociedade na
defesa do bem-estar do ser humano e da preservação do meio ambiente.
A intenção do legislador ao buscar a responsabilização das
empresas, foi, ao que nos parece, realizar a desobstrução dos canais da
impunidade e da incessante busca pelo lucro a revelia das consequências, e com
isso, asseverou as penalizações dos grupos de pessoas que, constituídas em
pessoa jurídica, poderiam cometer ocultamente crimes ambientais sem
preocupar-se com as consequências de suas ações.
Outrossim, é nada mais, nada menos, que a possibilidade
total e absoluta de ingerência tutelar na esfera civil, penal e administrativa
dos entes coletivos, com vistas a coercibilidade dos atos delinquentes e a
proteção do bem jurídico tutelado. É cediço que muitos avançados ainda precisam
ser realizados, entretanto, a evolução social se amolda no direito e o direito
assim tutela os bem mais importantes e fundamentais de um estado. Se assim não
o fosse, o estado não poderia proteger o bem comum.
REFERÊNCIAS
BEVILACQUA,
Clóvis. Teoria
Geral do Direito Civil. 2.ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves,
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<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ Decreto-Lei/del2848.htm>. Acesso:
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______. Lei
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União, Brasília, 13 fev. 1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9605.htm>
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______.
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[1] Mestrando em Direito pela Universidade
Caxias do Sul (UCS); Pós-graduação Lato Sensu em Direito Constitucional,
Administrativo e Tributário pela Escola Paulista de Direito (EPD); Presidente
da Comissão de Segurança Pública e Assuntos Prisionais da 20ª Subseção/OAB/SC;
Membro efetivo do Instituto dos Advogados de Santa Catarina (IASC); Advogado.
[2] Vide art. 225, §3º da CRFB/1988.
[3] Vide arts.
33, 34, 157. Código
Civil Português. Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa.
[4] Vide art. 45 da Lei nº 10.406, 2002.
(Código Civil Brasileiro).
[5] Vide art. 173, §5º da
CRFB, 1988.
[6] Material é exposição a perigo de bens
jurídicos fundamentais para a vida social; formal é a conduta abstrata proibida
descrita no tipo penal.
[7] Vide
art. 23 da Lei nº 2.848/40.
[9] Para a doutrina majoritária a pessoa
jurídica tem existência real, porém, esta é conferida por lei. Nos termos do art.
45 da Lei nº 10.406/03.
[11] Vide Lei Federal nº 9.605/98.