A vida humana deve ser preservada
a qualquer preço. Não há dúvidas de que a senhora Marielle era uma das vozes
ativas das comunidades e populações carentes na sua região. Defensora dos
direitos humanos. Tinha sua plataforma política lastreada nos enfrentamentos,
no combate às desigualdades, de cor, raça, gênero. Lutava com coragem e
abnegação pelo controle dos índices de violência, buscando sua redução.
Protegia a periferia do estado fluminense.
Qualquer pessoa que tivesse sua
vida ceifada, nas condições que a vida da senhora Marielle foi ceifada, comoveria
a nação. Já tão carente de medidas de proteção e moralidade. Não se espera das
autoridades qualquer postura diferente do que a apuração adequada e rigorosa do
requerimento implícito de respeito à dignidade da pessoa humana insculpido
expressamente na Constituição Federal. Princípio de rara beleza, mas de
aplicação putrefata, porquanto, perdido nos corredores da máquina pública.
Diante da inércia do Estado, que
falaciosamente pugna pela supremacia do interesse público, sem que haja real
interesse do público. Realidade caótica que fomenta o nascimento da resistência
por meio de pessoas como a senhora Marielle. Inexiste respeito os direitos
fundamentais. É o que se vê. Existem direitos superficiais de importância
duvidosa para o Grande Leviatã de Hobbes.
O assassinato da senhora
Marielle, da forma brutal e covarde como foi, não retrata um fato isolado,
único, mas uma realidade vivenciada diariamente pelos moradores das comunidades
dos morros e do asfalto no Rio de Janeiro. São reiterados atos de acefalia do
Estado Brasileiro, impotente diante da força criminosa que tomou conta daquele
lugar. Salve-se quem puder e esqueçam o interesse público se houver. Reflitamos
apenas que, da mais valia, poderá decorrer a anomalia em face dos deveres
conquistados a duras penas sociofundamentais do poder estatal.
Tudo leva a crer em um ato de
execução repressora sumária encomendada. Mas, não se pode afirmar. É preciso
apurar. Já basta dessa intensa valoração de juízos midiáticos que, da noite
para o dia, tornam-se especialistas em qualquer assunto. Apropriação indébita
da razão que não lhes pertence. Seria leviano afirmar o motivo sem o devido
conjunto probatório, necessário para levar a crer ser os motivos, políticos,
sociais, repressores ou policiais, que ceifaram Marielle.
É certo que o amesquinhamento da
seletividade insurgida apenas dará ibope midiático sem a consequente
verossimilhança da alegação.
Um cem número de Policiais e
outros cidadãos também morrem por execuções sumárias encomendadas. Não encubro
este sol, a forma como ocorreu, 4 tiros na cabeça, sim, foi execução. Nesse
tipo de crime é preciso celeridade e eficiência, elementos em falta no sistema público
de segurança, e, portanto, nem sempre se chega aos autores. Mas, o aparato foi
posto à prova.
Federais, estaduais, municipais,
todos trabalham com foco na solução deste caso. Seria bom se assim o fizessem
no SUS também, guardando as devidas proporções. Certo é que toda a encomenda
segue um modus operandi disciplinado
com roubo de carros, crime perfeito, sem vestígios para não deixar suspeitos,
tudo sob o controle do crime organizado, ou não.
Nada se sabe por enquanto.
Exceção à regra, quando o aparato da máquina estatal funciona em benefício de
um caso, não há crime perfeito. E assim será com Marielle, que conseguiu com
sua morte trágica, desencadear um grito. Uma só voz do povo sofrido marcado,
mas feliz. Talvez.
Perdeu a família, perdeu a
sociedade, ganhou a coletividade. Chamando atenção para o caos da pública
segurança que fortalece o faccionamento do crime, cujo escritório atende nas
unidades prisionais brasileiras. Em suma, a coluna sustentadora da impunidade
do mal encontra ressonância na base consolidada da ineficiência do Estado.
O que se tem é a possibilidade
também, de que o crime tenha sido com viés político, pelo menos esta é uma das
linhas investigativas, pelo que, Marielle, era militante intensa da voz
marginal. Não no sentido pejorativo, mas na esfera dos excluídos socialmente
pelo sistema que padece de hipertrofia negativa Estatal.
Contudo, falar em crime político,
pelo positivismo que se tem no ordenamento jurídico nacional, é invocar a lei
de segurança nacional (Lei n. 7.170/83). A doutrina dominante segue pelo dolo
específico da conduta. A Magna carta cidadã não define o que seja crime político,
cabe ao guardião da Constituição dar vida a esta hermenêutica, subjetivamente, de
acordo com o caso concreto e o ordenamento vigente. Pronto, aqui começam os
precedentes. Sem regra, sem concordância.
Conforme entende a Suprema Corte,
só se verifica a existência de crime se preencherem os dispositivos da LSN (lei
n. 7.170/83). Lesão real ou exposição a perigo de lesão a soberania nacional
com motivação política. E somente se enquadram aqui quando se referir a
integridade territorial, soberania nacional, regime representativo,
democrático, a federação e o estado de direito, a pessoa dos chefes dos poderes
da união (art. 1ª, I, II, III).
Aparentemente, até prova em
contrário não temos um crime político, mas sabemos da atuação intensa e
marcante da vereadora (agente político) nas ações de combate as milícias, isso
pode ter atraído o derradeiro momento de sua vida.
Temos um Estado nacional
desplanejado, ignóbil ao real e verdadeiro interesse público, cujos reféns são várias
Marielles e Amarildos. O poder paralelo do narcotráfico, associado a força
milícia dominante, ignorante às leis e altiva nos requintes de crueldade com
que tratam os demais protagonistas deste cenário, renegado e sem importância,
desprovido de jurisdição com eficiência e legalmente constituído. Pasmém, o bem
jurídico tutelado se mostra falacioso.
Temerária, mas não inverossímil,
é a repudiosa e distinta capacidade que personalidades políticas de esquerda ou
direita têm demonstrado, em total desrespeito com a execução de Marielle, de
usurpar a importância do fato, manipulando as informações para proveito
temático de plataforma política eleitoral. A execução dessa senhora defensora
dos direitos das minorias, deve servir para mudar o modelo de estado que aí
impera, descumpridor dos deveres de tutela e proteção social. Rogamos assim,
que os sentidos estejam alertas em favor de muitos e não só de uma, mas que
esta uma, sirva de exemplo para demonstrar escancaradamente a incompetência com
que o Estado brasileiro vem tratando suas questões mais importantes, quais
sejam, as relacionadas a vida e a dignidade da pessoa humana.
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